quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O autor novato e o medo do plágio

Agora mesmo, de bate-pronto (não vale pesquisar antes no Google): quantos livros você conhece que foram plagiados? Eu só saberia dizer de um (Max e os Felinos, de Moacyr Scliar) e, ainda assim, no frigir dos ovos, Scliar considerou que, por parte do outro autor (Yann Martel), houve apenas "um certo desleixo":(http://www.estadao.com.br/arquivo/arteelazer/2002/not20021107p2691.htm).

Ora bolas, por que motivo então o autor novato tem tanto medo de ter sua obra plagiada? E a resposta é simples: todo autor novato - até por certa inexperiência, e por enorme valoração do ego - pensa sempre ter encontrado o ovo de colombo, isto é, que sua obra será o próximo divisor de águas da literatura mundial (algo como um Dom Quixote, de Cervantes).

O que recomendo: que o autor não se descuide, porém, que desencane disso - e procure escrever o melhor livro possível.

Recentemente, pela Internet, com um pessoal bastante conceituado (Oficina de Escritores - OE), tivemos essa mesma discussão e, por ser assunto recorrente, resolvi expôr alguns conceitos por aqui hoje.


Na literatura, para que algo seja considerado plágio é praticamente necessário que o outro pegue a sua obra e a publique como se dele fosse. "Ora, Marcio, você está dizendo que..." Isso mesmo, ideias não são propriedade deste ou daquele MAS DAQUELE QUE PRIMEIRO A EXECUTA. Ainda assim, depois dessa primeira publicação de conteúdo tão inédito e revelador, outros podem também assim fazê-lo. Vejamos um trecho extraído do próprio site da Fundação Bibiloteca Nacional (FBN), local onde se registram as obras:

Assim, se duas obras, sob formas de expressão diversas, contêm a mesma ideia, segue-se que nenhuma poderá ser havida como plágio da outra. Tão somente porque a forma de expressão é diversa? Não. Mas porque a ideia é comum, pertencendo a todos, não pertence exclusivamente aos autores das obra em conflito. Com efeito, as ideias pertencem ao patrimônio comum da humanidade. Já se pensou (sic) em que insuportável Idade Média estaríamos mergulhados se ao homem fosse dado o ter monopólio das ideias? A livre circulação das ideias é, portanto, um imperativo do progresso da humanidade, o que não precisa ser demonstrado.

E passo aí embaixo tanto o link de onde foi tirada a citação e, ratificando o dito acima, o mesmo site que explica como sua obra pode ser registrada, caso assim o deseje.


Também, gostaria de lembrar ao leitor do blog  de dois importantes conceitos: dialogismo e intertextualidade. Caso o leitor deles ainda não tenha ouvido falar, que saia daqui, pelo menos, com algum conhecimento.

Dialogismo significa dizer que todo texto dialoga com os textos que o antecederam, cujo conteúdo e conhecimento, de certo modo, comunicam-se entre si. Ou seja, o seu texto, amigo escritor, ele não nasce do nada, daquilo que seria considerado totalmente inédito, com requintes de originalidade; mas, sim, fruto de uma tradição e, portanto, dialoga com tudo aquilo que o precedeu, inclusive os livros e os autores que você tanto leu e aprecia. Para explicar esse conceito, gosto muito da metáfora de uma criança: Como ela aprendeu a falar?

É óbvio que a partir dos pais, dos irmãos mais velhos, dos amigos da pré-escola, da televisão, enfim, de tudo aquilo que a rodeia e a bombardeia no seu dia a dia: palavras, formas, ideias, conceitos etc. E como se aprende a escrever? A partir desse mesmo modelo, fazendo-se notar a importância da escola, e aí já começar a entrar os seus primeiros autores, meu camarada. Isso é dialogismo: você é um ser social, dialoga e aprende com o mundo que o rodeia.


Intertextualidade, grosso modo, é criar um texto a partir de outro pré-existente, ou dele fazer uso no interior de sua obra (pouco ou muito), incluindo-se aí outros tipos de arte, como cinema, pintura etc.


Portanto, meu amigo, dificilmente você irá conseguir escrever algo assim tão inédito, tão exclusivo, que não tenha sido pensado, avaliado, ou até mesmo escrito, por outro. Não quero entrar aqui nessa seara, porém, o que seria enfim um texto considerado original? Lembro também que os gêneros textuais já estão aí estabelecidos pela tradição, suas estruturas prontas e disponíveis para serem utilizadas por aquele que se dispôr a fazê-lo.

Para não me estender demasiadamente (isto aqui é um blog), descrevo aí embaixo algumas formas do autor mais temeroso se prevenir quanto ao temido plágio de sua obra:


  • Entrar no site da Fundação Biblioteca Nacional (FBN) e aprender como fazer o registro de sua obra (link aí em cima);
  • Enviar uma cópia pelo correio, para você mesmo ou para terceiros, e mantê-la devidamente lacrada;
  • Manter cópias de seus arquivos em pastas de e-mail, como no caso do correio, enviando para você mesmo.

Todas elas, que eu saiba, têm validade legal, além de eventuais testemunhos pessoais de terceiros.

Do meu lado, sempre afirmo que adoraria firmemente ser plagiado e que, de preferência, esta se tornasse um estupendo sucesso de vendas, um inesgotável best-seller (e não se trata de ironia, mas uma questão lógica de Direito).

Finalizo com conhecida frase do meio acadêmico: copiar de um, é plágio; copiar de muitos, é pesquisa.


2 comentários:

  1. Excelente postagem! Incrível como você consegue discorrer com simplicidade em assuntos como dialigismo e intertextualidade, sem o pedantismo com o qual nos deparamos tantas vezes em leituras da faculdade.
    Admiro-te imenso, caro amigo!!!
    E recomendarei este texto em especial a todos!

    Beijos,

    Mad

    ResponderExcluir
  2. Obrigado pelas gentis palavras. E foi essa mesma a intenção do blog, repassar aos estudiosos da escrita, ou amantes da literatura, alguns conceitos básicos, porém, sem pedantismo. Abraço.

    ResponderExcluir